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segunda-feira, 31 de maio de 2010

Coluna do Ary Ribeiro

31/05/2010 Ary Ribeiro é jornalista e escreve às segundas neste blog.

LA DONNA È MOBILE

Não pude deixar de pensar na famosa ária da ópera Rigoletto, de Verdi, ao ler artigos, no fim de semana, sobre as mudanças por que tem passado a pré-candidata Dilma Rousseff.

Para quem não está lembrado da ária, vão aqui os versos da primeira estrofe:

La donna è mobile
qual piuma al vento
muta d'accento
e di pensiero

Temos a primeira Dilma, a jovem mineira, filha de família de classe média alta, que estudou em bons colégios, interessou-se pelo movimento estudantil e, lá pelos seus 18 anos, ingressou na luta armada contra o regime militar. Passou a integrar grupos comunistas de orientação variada – leninista, maoísta, albanesa e cubana – que se opunham tanto à ditadura então vigente quanto ao possível retorno ao que chamavam de “democracia burguesa”. Ou seja, queriam trocar uma ditadura por outra, muito pior, como se viu nos países em que vigorou e se vê nos poucos que restam. Pode-se alegar, em favor dela que, muito jovem, não tinha bem consciência dos objetivos por que lutava. Afinal, os países do lado de lá da chamada “Cortina de Ferro” ainda não se haviam desmoronado e pouca gente lera o famoso Relatório de Kruchev, de 1956, denunciando os horrores praticados por Stalin, e que eram, na verdade, da essência do regime. Bem, essa Dilma não chegamos a conhecer, a não ser pelas notícias de sua atuação, dos quase três anos que passou na prisão e do mundo de coisas que a seu respeito circulam pela Internet e que devem ser vistas com muita reserva. Há grosseiras mentiras. Outro dia recebi e-mail dizendo que, se eleita Presidente da República, ela não poderia representar o Brasil na ONU, porque teria prisão decretada nos Estados Unidos. Não fosse o fato de a ONU ser reconhecida como território neutro, naquele mesmo dia, por coincidência, Dilma estava em Nova York, concedendo entrevista à imprensa. Coisas da Internet...

Temos a segunda Dilma, a Dilma durona, que ficamos conhecendo com a chegada de Lula ao poder. Ela já passara por cargos administrativos no Rio Grande do Sul, segundo alguns, sem muito sucesso. Não era, porém, conhecida além das divisas do Estado e dos remanescentes da luta armada. Foi feita ministra das Minas e Energia – e conseguiu certa notoriedade, por aparentar, primeiro, ter conhecimento da área e, depois, pela energia (sem trocadilho) com que comandava a pasta. Certa vez, eu a vi fazendo exposição num congresso ou seminário e fiquei bem impressionado. Parecia competente. Posteriormente, sua competência foi questionada, porque não teria tomado, quando ministra, providências preventivas nas linhas de transmissão para evitar um apagão como aquele de novembro do ano passado, que atingiu 12 Estados.

Foi, porém, graças ao bom conceito que adquiriu como ministra das Minas e Energia que o presidente Lula a levou para a chefia da Casa Civil, em substituição a José Dirceu, que, atingindo pela crise do mensalão, teve de deixar o governo. Aí ela granjeou a reputação de ser durona, muitas vezes ríspida até com colegas ministros e com subalternos. Era a coordenadora da Administração e sobretudo – “mãe”, inclusive – do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), cujo êxito é fortamente questionado.

E temos a terceira Dilma, a Dilma dos marqueteiros – e do cabelereiro paulista Kamura, o mesmo de Marta Suplicy e de algumas atrizes. Essa está surpreendendo a todos. Vestidos bem cortados, sapatos caros, cabelo armado para cima. O rosto, antes duro, agora é só sorrisos. É a nova Dilma, Dilma paz e amor.

Como é mobile a Dona Dilma! Mas, no fundo, não é de espantar. O criador de sua candidatura passou também por grande transformação e até se disse “uma metamorfose ambulante”.

Qual das Dilmas, se eleita, governaria o Brasil? E será que não existe mais alguma?


ENTORNADO O CAFÉ-COM-LEITE

O ex-governador Aécio Neves retornou das férias no exterior e virou a xícara de café-com-leite político que estavam preparando para dar mais visibilidade à aliança São Paulo/Minas. Ele, peremptoriamente, descartou a possibilidade de aceitar a vice-presidência na chapa de Serra, assegurando que trabalhará pela vitória da mesma maneira, mas prefere disputar uma cadeira no Senado e dedicar-se mais à campanha de Anastásia para sucedê-lo no Estado. Dizem que ele se valeu de pesquisas indicando que a votação em Serra independeria do fato de vir a ser vice ou não.

Então, os tucanos e seus aliados estão à busca de um nome para vice. Para mim, o que poderia dar forte impacto positivo à chapa seria o da senadora Kátia Abreu (DEM-TO). Primeiro, por ser mulher; segundo, por ser empresária e política vitoriosa, a ponto de ter conquistado a presidência da poderosa Confederação Nacional da Agricultura e da Pecuária (CNA), reduto masculino por excelência; e, terceiro – mas não em último lugar – por ser competente e combativa. Podem alegar que ela afugentaria certo eleitorado por ser a representante do agro-negócio e dos ruralistas em geral e inimiga declarada do MST. Só afugentaria, porém, eleitores que não votam mesmo em Serra.

2 comentários:

Jose Ricardo da Costa e Silva disse...

Há 25 ou 30 anos anos, mais jovem, inexperiente e vivendo em uma ditadura militar, eu não saberia dizer que uma ditadura de esquerda era algo ruim. Hoje eu concordo 100% com o comentário do Ary. As ditaduras de esquerda são bem piores que as de direita. Duram muito mais, e quem é contra ela é considerado doente mental.

Pedro Lage disse...

Muito bom o artigo! É muito triste vermos o Brasil deixar de aproveitar oportunidades de se educar, de promover condições de desenvolvimento permanente, e ganhar as eleições com assistencialismo sem propósitos de longo prazo.
Uma pergunta interessante a se fazer aos candidatos é: o que vocês fariam de diferente no próximo governo - Dilma com relação a Lula, e Serra com relação a seu governo em SP?