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segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Poesia - Falácias de amor?

Hoje o Blog do Zé Ricardo publica linda poesia de nossa poetiza Rosa Maria. Desejamos que ela sempre honre este endereço com a doçura de seus poemas. Zé Ricardo


Rosa Maria

A ardencia dos meus olhos
incendiou o morno do teu olhar.
Divinizou o humano
do que acreditei ser
o mais sublime de todos os amores...

A roupagem brilhante
dos sonhos ilusórios,
revestiu de belezas,
o seguir do romance.
Gerou as rosas rubras,
olorosas,
ofertas,
na extinção dos espinhos.
Alcatifou veredas
para que, em tuas andanças,
teus pés, sentissem, apenas,
um aconchego de sedas...

Um mundo de respostas,
foi a paixão decodificando,
nos embalos da seleção das frases...

Fiz baixarem as estrelas
e brilharem nos teus olhos,
quando o beijo fez nascer a luz
e a música imortal
explodiu em acordes
que silenciaram outras vozes
e desterraram a razão...

Fez-se leito macio, a relva verde
no perfume das manhãs,
ainda sonolentas,
prolongando a noite de um amor,
que supunha sem fim...

Fez-se esperança,
na união da posse.
Fez-se certeza,
nos corpos verdes da ilusão

de um destino,
acenando faceiro,
na eterna miragem dos devaneios.

Tua voz, fez-se promessa.
Tua boca, aurora de desejos.
Tuas mãos, escultoras de formas sensuais...
O instante transcendentalizou-se,
afastando o efêmero,
nos proclamas do perene...

O conceito do sempre,
reafirmou-se, potente,
na duração do momento
sentido em plenitude,
no agora, sem depois...

Entretanto...

Que importa se as estrelas
desertaram teus olhos
e voltaram a constelar os céus?

Se na relva desbotada,
permanece tão somente,
a marca leve de nossos corpos?

Se se calaram as vozes
e retombaram as mãos
sem outras criações esculturais?

Se as vestes multicores,
desfizeram-se, na abertura do olhar
e desnudo ficou o corpo
indeciso, desataviado,
marionete, sem controles?

Se as palavras ficaram prenhes
de sentidos cruéis?
De mensagens vazias?

Se de fato,
as rosas tem os espinhos
que compõem sua essência?

Se nos caminhos,
as pedras permanecem
e o trilhar exige, ás vezes,
esforço de titãs?

Nada importa!...

Se a realidade desvestiu a ilusão,
subsiste a força do vivido,
grandiloquente,
intenso,
imorredouro...

O retorno da razão anistiada,
redimensionou as emoções.
Resgatou a consequencia
nos parâmetros reais
das possibilidades.

Com esse mágico voltar
das memórias,
reconstruo o instante da ventura.
Reedifico o castelo das quimeras...

O belo, em múltiplas facetas,
adorna meu sonhar.
Na prismática visão do espelho,
refletindo ao infinito,
imagens desdobradas
reproduzindo sorrisos
musicais...

Então...

Idealizo, outra vez, o meu amor...
E assim sou feliz,
feliz,
feliz,
recriando no coração sem mágoas,
reinventando no tempo companheiro,
a minha branca estória...

Rosa Maria
Brasília, 17, Dezembro, 2009

Coluna do Ary: JABUTI NA ÁRVORE

Ary Ribeiro em 22/02/2010

Um antigo e muito esperto político maranhense, Vitorino Freire, costumava dizer que se alguém visse um jabuti no galho de uma árvore podia estar certo de que ele fora parar lá por enchente ou mão de gente.

Na verdade, esse é um ditado popular e que me ocorre a propósito do que vem acontecendo com o DEM. Primeiro sofreu um tiro de canhão quando estourou o escândalo de Brasília. Arruda, o único governador que conseguira eleger, está preso e o vice, Paulo Otávio, está enredado nos mesmos problemas. E agora, para completar, um juiz de primeira instância, em São Paulo, determinou a cassação do mandato do prefeito da Capital, Gilberto Kassab. Cabe recurso. Mas o DEM corre o risco de ficar sem os dois principais postos que conquistara no País.

Sem entrar no mérito dos acontecimentos, fico a perguntar-me: será mão de gente? O DEM é o principal parceiro do PSDB. Era dele o vice (senador Marco Maciel) de Fernando Henrique e poderia, em tese, indicar o vice na chapa de Serra. O prefeito Kassab foi uma “revelação” do governador José Serra, que garantiu sua reeleição contra até a candidatura tucana de Alckmin. De forma que esses tiros que atingiram em cheio a cidadela do DEM, não deixam de causar estragos na área do partido aliado e do seu candidato. Não se pode imaginar que juízes estejam fazendo qualquer tipo de jogo político. Naturalmente havia elementos suficientes, nos autos, para justificar as decisões. No caso de Brasília, há até filmes, inclusive daquele esquisito pagamento de suposto suborno de testemunha – fato determinante para a prisão de Arruda. Mas no caso do “mensalão” havia também provas indiciais abundantes e até confissão de recebimento de dinheiro no exterior e, no entanto, ninguém foi preso. Há processos em curso no Supremo Tribunal Federal, mas alguns dos mais proeminentes acusados estão por aí, fagueiros, e voltando a ocupar postos de direção partidária.

Terão sido apenas coincidência, fruto do acaso, esses raios que desabaram sobre os dois principais cargos detidos pelo DEM, justamente no início – ainda que não oficial – de uma campanha eleitoral que promete ser dura, em que se pode esperar chutes na canela, carrinhos por trás, gols com a mão? Ou terá sido uma ação de bastidores visando a minar a candidatura tucana? Tudo é possível, pois, como disse Arnaldo Jabor em seu comentário de hoje, na CBN: “essa gente não vai querer largar o osso”.

* O autor é jornalista.

Geraldinho Vieira - Seitas, partidos e penas para todo lado

A partir de Hoje estaremos reproduzindo o artigo do jornalista Geraldinho Vieira, que é publicado todo domingo no Blog do Noblat, com a autorização de ambos.
O de hoje fala de política.

Retirado do Blog do Noblat

A disputa presidencial que já está nas ruas sinaliza tempos de intolerância à medida que caminhamos para outubro.

Há riscos de espíritos armados e baixo teor de caloria intelectual: o debate político ameaça deixar de ser “debate” e ganha ares de guerra de torcida organizada em briga de galo.

Muita mesmice à venda na praça: multiplicam-se nas ruas, nos espaços do (e)leitor e também entre cronistas expressões catárticas de um fanatismo do tipo seita religiosa - “meu candidato faz mais milagre que o seu”, “o milagre que o seu santo fez, só foi possível graças à água benta produzida pelo meu”, “seu santo nunca foi santo e deixou isso aqui um inferno”...

Eleição à moda da casa: a “direita que não é direita” disputa contra a “esquerda que não é esquerda”, enquanto veículos de comunicação tangenciam (se tanto) uma reflexão sobre o futuro que queremos.

Muitos meios jornalísticos estão jogando pro mato os princípios básicos de uma imprensa plural para se tornaram eles também partidos.

É legítimo e aconselhável que toda empresa de comunicação tenha e torne pública sua preferência política: para isso serve o Editorial, mais que isso e o meio vira o “jornal da candidatura de fulano”.

Há um inegociável cenário de liberdade em nome da diversidade de expressões, claro; mas difícil tem sido encontrar o limite (e o equilíbrio) entre liberdade de imprensa e liberdade de empresa.

Uma lástima: depois de 8 anos pra lá e 8 anos pra cá, entre Lula e FH, bem que seria saudável existirem meios dispostos a um jornalismo de pluralizar debates, ampliar olhares, investigar tendências e vigiar todos os interesses.

É por perseguir essa missão que a imprensa tornou-se relevante para as sociedades contemporâneas. Por nada mais, por nada menos.

Um pouco de exagero? Talvez, mas a imprensa brasileira parece-me plural apenas na somatória do que produzem todas as empresas de comunicação, sites e blogs (ou seja, vista como cenário, panorama).

Se observados individualmente, entretanto, muitos dos meios se mostram com cores bem próximas das partidárias - o lado que não é ouvido num meio é a única voz do outro.

Mas não é a esta espécie de “pluralidade de cenário” que se refere o manual do ofício. Por isso, vivas às exceções!

Entretanto, (e)leitores não são apenas vítimas. Deveriam ser ao mesmo tempo consumidores exigentes e artífices de um melhor jornalismo, mas são, eles mesmos, quem diria, sensacionalistas: gostam da disputa de esporas, do cheiro de sangue das rinhas, das penas pra todo lado.

Quem adora a ditadura do pensamento único (o seu próprio), elege um jornalismo de pensamento único.

Acostumados a fazer política como quem está torcendo, querem ganhar ainda que com gol de mão e na verdade gostam é de humilhar o adversário.

Cidadãos de uma ainda muito jovem cidadania, irritam-se com a conversa democrática e partem logo pro pau, para a desqualificação do outro.

Com meios mais abertos que nunca para debater, comentar e refletir, é impressionante ver como uma multidão de (e)leitores faz da liberdade participativa um exercício de reação nervosa e torna-se mais disposta a destruir do que a contribuir para a riqueza do debate.

Basta navegar pela blogosfera para ver uma polarização de tendência é de crescente agressividade, perspectiva nada iluminadora.

Democracia e hipocrisia: do jeito que as coisas caminham, a democracia brasileira corre o risco de virar um sarapatel de interpretações distorcidas e orgias de reflexões tendenciosas com doses cavalares de intolerância.

Perde o Brasil, que fica pequeno quando os cidadãos e meios de comunicação que deveriam enriquecer a reflexão no espaço público tornam-se parecidos com os políticos. Santos de pau oco, políticos e partidos mereciam menos torcida cega e mais olhar crítico, todos eles!

Somos, todos, co-responsáveis pela qualidade da informação, do debate (não apenas quando está em jogo a disputa de poder, mas sempre e em torno de todos os temas da realidade). Na luta dos partidos, somos co-responsáveis pela prática política que patrocinamos. Depois não reclama da política como ela é...

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Coluna do Ary: Tempos Cinzentos

Ary Ribeiro*

O ano, no Brasil, costuma-se dizer, começa depois do carnaval. Então, preparemo-nos para ele, que não promete ser fácil.

Em Brasília, temos o governador titular preso, sob acusação de obstruir a Justiça, o vice-governador, ora em exercício, sob acusação de envolvimento no mesmo esquema de corrupção e com pedidos de impeachment protocolados na Câmara Distrital e ameaça de expulsão do seu partido, o DEM, e, para culminar, um pedido de intervenção federal.

Então, neste “início” de ano, vamos assistir aos desdobramentos desses episódios, com o Supremo Tribunal Federal deliberando sobre a liminar do ministro Marco Aurélio, que manteve a prisão do governador Arruda, e sobre o pedido de intervenção no Distrito Federal. Eminentes juristas disseram não ver justificativa para essa medida, que atingiria a autonomia política e administrativa de Brasília – o que não seria de todo um mal, dado ter sido justamente ela a causa de toda a podridão a que estamos assistindo. Não se deve esperar, porém, pela intervenção, seja por serem frágeis os motivos alegados, seja por haver um mundo de interesses em sentido contrário. Por essa mesma razão também não se pode esperar pela volta à situação anterior, em que Brasília, por não ser um Estado e sim sede do Governo Federal, tinha o governador nomeado pelo Presidente da República (que podia também demiti-lo a qualquer momento), não tinha Câmara Distrital (cabia a uma Comissão do Senado legislar para Brasília) e não tinha representação no Congresso, embora devesse tê-la na Câmara dos Deputados.

Na Câmara Distrital, segundo a imprensa, registra-se mudança de situação. Vários deputados situacionistas vão abandonando a defesa de Arruda. Rei morto, rei posto... E os pedidos de impeachment contra o governador em exercício, Paulo Otávio? Ele alega serem descabidos, porque não praticou, como governador, nenhum ato que lhe desse causa. É um argumento técnico. No Congresso, ninguém também pode ter o mandato cassado com base em ações pretéritas, por mais condenáveis que tenham sido. Mas, numa Casa política, como é a Câmara Distrital, nem sempre prevalecem argumentos técnicos ou jurídicos.

No plano nacional, o ano “começa” com a notícia de que a dívida mobiliária federal chegou a R$ 1,4 trilhão, 44,7% do PIB, mais que o dobro da dívida herdada do Governo do PSDB de 0,6 trilhão (35,7% do PIB) e crescimento de 133 bilhões de reais em apenas um ano. Uma herança e tanto para o(a) sucessor(ora). O problema não é apenas do Governo Federal. A dívida das famílias brasileiras com cartões de crédito, empréstimos, compras diversas, segundo o jornal O Estado de S.Paulo, alcançou, no fim de ano passado, R$ 555 bilhões, representando 40% da renda anual da população. Um recorde. Mas não parece preocupar muito os endividados, pois a aprovação do presidente e do seu governo permanece em altos patamares.

Tampouco parece preocupar o governo. Sua atenção está voltada para as eleições deste ano. A Oposição que se prepare, porque o jogo promete ser duro. Não teremos futebol, mas rugby. O fato de o presidente Lula estar fazendo o que a Oposição denuncia como campanha antecipada – denúncias até aqui recusadas pelo Tribunal Superior Eleitoral – não é nem o começo do que virá por aí. Recentemente, atribuindo aos oposicionistas a promoção de “agressões”, ele disse (depois amenizou) estar preparado para enfrentá-los de igual para igual. "Pelos sinais que eu vi... – declarou – vale chutar do peito para cima. O que eles não sabem é que eu sou capoeirista.”

Realmente, não se pode esperar que centenas ou milhares de pessoas estejam dispostas a deixar tranqüilamente o paraíso das mordomias e dos altos e polpudos cargos, como se fosse troca natural de partidos no poder, mudanças de rumo na administração. Para muitas pessoas, houve substancial mudança de status. Circula pela Internet uma lista de ex-dirigentes sindicais que hoje ocupam postos na administração federal ganhando muitas vezes mais do que nos sindicatos, sem falar nos salários que tinham como trabalhadores.

A Oposição, por sua vez, com certeza, não ficará inerte. Uma amostra disso ela já deu às vésperas do carnaval, quando, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, aproveitando-se de descuido da base governista, aprovou a convocação da ministra Dilma Rousseff, para prestar esclarecimentos sobre tema explosivo, o controvertido Plano Nacional de Direitos Humanos-3.

Enfim, não haverá somente uma quarta-feira de cinzas, mas tempos cinzentos.

* O autor é jornalista.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Coluna do Ary: O MAL DA ELEIÇÃO NO DF

Ary Ribeiro *


Na semana passada, encerrei breve comentário sobre os escândalos políticos em Brasília dizendo que, para mim, tudo isso, em última análise, é fruto da autonomia que os constituintes de 1988 conferiram ao Distrito Federal, com o que nós, habitantes, ganhamos o direito de eleger o governador, deputados federais, senadores e uma “bela” Câmara Distrital.

Antes de entrar nesse assunto, não posso deixar de mencionar o último lance dos recentes episódios que envergonham Brasília: a suposta tentativa de suborno, cena absolutamente bizarra, porque – como se pode ver no filme e na foto – a sacola de dinheiro é passada de uma personagem a outra ostensivamente, por cima da mesa de um bar ou confeitaria, coisa curiosa num ato que, por sua natureza, sugeriria o máximo de cautela, discrição, quem sabe um encontro em local livre de qualquer possível testemunha. Bem, o fato já está nas mãos da Polícia e dos advogados, aos quais cabe analisar esse estranho fato.

Retomo o tema da eleição em Brasília. O Brasil gosta muito, no plano institucional, de tomar por paradigma os Estados Unidos. Por isso, é um dos poucos países que mantêm o sistema presidencialista de governo, em vez do parlamentarismo, muito mais avançado. A exemplo da cidade de Washington, que se confunde com o Distrito de Colúmbia, Brasília, a Capital brasileira, confunde-se com o Distrito Federal. Tanto o D.C. quanto o DF não são Estados, são a sede do governo federal. Por isso, Washington é governada pelo Congresso, tem representação na Câmara (sem direito a voto), mas não no Senado, e seus habitantes só votam na eleição presidencial. (Informações da Wikipedia.)

Aqui foi mais ou menos assim por 30 anos. O administrador do DF (primeiro, com o título de Prefeito, depois, de Governador) era nomeado pelo presidente da República, como um Ministro de Estado, sendo, como este, demissível ad nutum. A legislação da Capital ficava a cargo de uma Comissão da mais alta Câmara do País, o Senado (na época, com respeitabilidade bem mais alta que a de hoje). Ou seja, cabia a homens experientes e sem interesse eleitoral na cidade, legislar para o Distrito Federal. A população não tinha representação nem na Câmara dos Deputados nem no Senado, só votando para Presidente da República. E Brasília vivia bem. Teve excelentes (alguns, nem tanto) e probos administradores, a começar por Israel Pinheiro, que depois de ter comandado sua construção, foi seu primeiro prefeito (17/04/60 a 21/01/61). Vale destacar algumas administrações: a do prefeito Plínio Catanhade, que entre outras coisas implantou a estrutura básica de Saúde); a de Wadjô Gomide, que construiu o Guará; a de Hélio Prates, que criou a Ceilândia, para lá transferindo as favelas que se espalhavam pela cidade, inclusive a maior delas, chamada “Invasão do IAPI”; e a de Elmo Serejo Farias, que, enfrentando até ameaça de morte, criou o Parque da Cidade, salvando aquela imensa área da sanha das construtoras e entregando-a ao lazer da população.

Tudo ia bem, até que o presidente José Sarney convocou a Assembléia Constituinte, dando aos brasilienses o direito de nela se representar. E foram esses representantes que consagraram, no texto Constitucional, a autonomia do DF, conferindo-nos o direito de eleger governador, deputados federais e senadores e de constituir uma Câmara Distrital. Ao menos um dos responsáveis por essa infeliz iniciativa confessou-me, há alguns anos, ter-se arrependido. E mais arrependido deve estar agora ao ver a que ponto de indignidade chegou grande parte dos políticos locais, desde que o primeiro governador eleito, Joaquim Roriz, com distribuição de lotes, estimulou o inchaço populacional na periferia (houve, no período, migração de populações rurais para os grandes centros urbanos, mas aqui ao fenômeno natural se juntou o incentivo oficial), local propício para “currais eleitorais” e políticas populistas. Neles procuraram se cevar também deputados distritais. E como isso custa dinheiro, muito dinheiro, escancaram-se as portas para a corrupção. Deu no que deu. É difícil, mas se deveria aproveitar as circunstâncias favoráveis de hoje para se extinguir a Câmara Distrital e devolver ao presidente da República a nomeação do prefeito (ou governador) de Brasília (afinal, aqui é a sede do Governo Federal), deixando-nos com o direito de eleger o presidente da República e deputados federais. Deputados sim, porque a Câmara representa o povo. Senadores, não, porque estes representam os Estados, e o DF não é um Estado. Os interesses do DF seriam defendidos diretamente pelo Governo Federal. O momento é este.

* O autor é jornalista.

Sem medo do passado

Fernando Henrique Cardoso - retirado do Blog do Noblat

O presidente Lula passa por momentos de euforia que o levam a inventar inimigos e enunciar inverdades. Para ganhar sua guerra imaginária distorce o ocorrido no governo do antecessor, autoglorifica-se na comparação e sugere que, se a oposição ganhar, será o caos.

Por trás dessas bravatas está o personalismo e o fantasma da intolerância: só eu e os meus somos capazes de tanta glória. Houve quem dissesse "o Estado sou eu". Lula dirá: "o Brasil sou eu!" Ecos de um autoritarismo mais chegado à direita.

Lamento que Lula se deixe contaminar por impulsos tão toscos e perigosos. Ele possui méritos de sobra para defender a candidatura que queira. Deu passos adiante no que fora plantado por seus antecessores. Para que, então, baixar o nível da política à dissimulação e à mentira?

A estratégia do petismo-lulista é simples: desconstruir o inimigo principal, o PSDB e FHC (muita honra para um pobre marquês...). Por que seríamos o inimigo principal? Porque podemos ganhar as eleições.

Como desconstruir o inimigo? Negando o que de bom foi feito e apossando-se de tudo que dele herdaram como se deles sempre tivesse sido. Onde está a política mais consciente e benéfica para todos? No ralo.

Na campanha haverá um mote — o governo do PSDB foi "neoliberal" — e dois alvos principais: a privatização das estatais e a suposta inação na área social.

Os dados dizem outra coisa. Mas, os dados, ora os dados... O que conta é repetir a versão conveniente.

Há três semanas, Lula disse que recebeu um governo estagnado, sem plano de desenvolvimento. Esqueceu-se da estabilidade da moeda, da lei de responsabilidade fiscal, da recuperação do BNDES, da modernização da Petrobras, que triplicou a produção depois do fim do monopólio e, premida pela competição e beneficiada pela flexibilidade, chegou à descoberta do pré-sal.

Esqueceu-se do fortalecimento do Banco do Brasil, capitalizado com mais de R$ 6 bilhões e, junto com a Caixa Econômica, libertados da politicagem e recuperados para a execução de políticas de Estado.

Esqueceu-se dos investimentos do programa Avança Brasil, que, com menos alarde e mais eficiência que o PAC, permitiu concluir um número maior de obras essenciais ao país.

Esqueceu-se dos ganhos que a privatização do sistema Telebrás trouxe para o povo brasileiro, com a democratização do acesso à internet e aos celulares, do fato de que a Vale privatizada paga mais impostos ao governo do que este jamais recebeu em dividendos quando a empresa era estatal, de que a Embraer, hoje orgulho nacional, só pôde dar o salto que deu depois de privatizada, de que essas empresas continuam em mãos brasileiras, gerando empregos e desenvolvimento no país.

Esqueceu-se de que o país pagou um custo alto por anos de "bravata" do PT e dele próprio.

Esqueceu-se de sua responsabilidade e de seu partido pelo temor que tomou conta dos mercados em 2002, quando fomos obrigados a pedir socorro ao FMI — com aval de Lula, diga-se — para que houvesse um colchão de reservas no início do governo seguinte.

Esqueceu-se de que foi esse temor que atiçou a inflação e levou seu governo a elevar o superávit primário e os juros às nuvens em 2003, para comprar a confiança dos mercados, mesmo que à custa de tudo que haviam pregado, ele e seu partido, nos anos anteriores.

Os exemplos são inúmeros para desmontar o espantalho petista sobre o suposto "neoliberalismo" peessedebista. Alguns vêm do próprio campo petista.

Vejam o que disse o atual presidente do partido, José Eduardo Dutra, ex-presidente da Petrobras, citado por Adriano Pires, no Brasil Econômico de 13/1/2010:

"Se eu voltar ao parlamento e tiver uma emenda propondo a situação anterior (monopólio), voto contra. Quando foi quebrado o monopólio, a Petrobras produzia 600 mil barris por dia e tinha seis milhões de barris de reservas. Dez anos depois produz 1,8 milhão por dia, tem reservas de 13 bilhões. Venceu a realidade, que muitas vezes é bem diferente da idealização que a gente faz dela".

O outro alvo da distorção petista refere-se à insensibilidade social de quem só se preocuparia com a economia.

Os fatos são diferentes: com o Real, a população pobre diminuiu de 35% para 28% do total. A pobreza continuou caindo, com alguma oscilação, até atingir 18% em 2007, fruto do efeito acumulado de políticas sociais e econômicas, entre elas o aumento do salário mínimo.

De 1995 a 2002, houve um aumento real de 47,4%; de 2003 a 2009, de 49,5%. O rendimento médio mensal dos trabalhadores, descontada a inflação, não cresceu espetacularmente no período, salvo entre 1993 e 1997, quando saltou de R$ 800 para aproximadamente R$ 1.200. Hoje se encontra abaixo do nível alcançado nos anos iniciais do Plano Real.

Por fim, os programas de transferência direta de renda (hoje Bolsa Família), vendidos como uma exclusividade deste governo. Na verdade, eles começaram em um município (Campinas) e no Distrito Federal, estenderam-se para estados (Goiás) e ganharam abrangência nacional em meu governo.

O Bolsa Escola atingiu cerca de cinco milhões de famílias, às quais o governo atual juntou outras seis milhões, já com o nome de Bolsa Família, englobando em uma só bolsa os programas anteriores.

É mentira, portanto, dizer que o PSDB "não olhou para o social". Não apenas olhou como fez e fez muito nessa área: o SUS saiu do papel à realidade; o programa da Aids tornou-se referência mundial; viabilizamos os medicamentos genéricos, sem temor às multinacionais; as equipes de Saúde da Família, pouco mais de 300 em 1994, tornaram-se mais de 16 mil em 2002; o programa "Toda Criança na Escola" trouxe para o ensino fundamental quase 100% das crianças de 7 a 14 anos.

Foi também no governo do PSDB que se pôs em prática a política que assiste hoje a mais de três milhões de idosos e deficientes (em 1996, eram apenas 300 mil).

Eleições não se ganham com o retrovisor. O eleitor vota em quem confia e lhe abre um horizonte de esperanças. Mas, se o lulismo quiser comparar, sem mentir e sem descontextualizar, a briga é boa. Nada a temer.



Fernando Henrique Cardoso é ex-presidente da República

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Coluna do Ary: O CHOQUE DAS IMAGENS

Ary Ribeiro *

Superfaturamento de obras, propinas, compra de votos, caixa 2, são fatos, infelizmente, corriqueiros na vida pública brasileira. Neste momento mesmo devem estar ocorrendo em vários Estados e também no plano federal. Basta lembrar que o Tribunal de Contas da União encontrou indícios de graves irregularidades em obras a cargo da Petrobrás. Segundo a imprensa, numa só delas, a da Refinaria Abreu Lima, em Pernambuco, o orçamento teria saltado de US$ 4,05 bilhões para US$ 12 bilhões. Agora surge outra notícia, a de que a Polícia Federal apontou superfaturamento de quase R$ 1 bilhão em obras aeroportuárias contratadas no curso do primeiro mandato do presidente Lula, o que não que ele soubesse disso.

Todos estão lembrados do “mensalão”, que guarda muita semelhança com os lamentáveis fatos ocorridos em Brasília. Só não houve imagens das malas de dinheiro que vinham periodicamente de Minas, dos aquinhoados embolsando sua parte e dos dólares escondidos na cueca de um deputado cearense, o que, para a Procuradoria-Geral da República, no entanto, foi considerado irrelevante. Ela encontrou material suficiente para denunciar quase 40 envolvidos, inclusive ex-ministros e políticos que integravam o alto escalão do Planalto e a direção do PT – e o STF instaurou os processos.

Houve, sim, algumas imagens, mas poucas: a daquele alto funcionário do Planalto pedindo propina a um empresário do jogo e outra de dinheiro sendo passado a um funcionário dos Correios – aliás, fato que desencadeou o episódio do “mensalão” – e, depois, daquele montão de dinheiro (até hoje de origem não identificada) descoberto, em São Paulo, com petistas que aparentemente pretendiam usá-lo para adquirir falso dossiê contra José Serra, então candidato ao governo de São Paulo nas últimas eleições.

Então, por que o choque com o escândalo de Brasília, se esses fatos não constituem novidade? Porque aqui tudo foi meticulosamente filmado. Foi o choque das imagens, de se ver por dentro o monstro da corrupção. Todo mundo, no País inteiro, pôde ver a naturalidade, a desfaçatez e até, se pode dizer, a displicência com que alguns recebiam boladas de dinheiro e as colocavam em pastas, bolsas, meias - e até se agradecia a Deus pelo dinheiro fácil ... Foi isso que nos deixou revoltados, além do vulto que a coisa tomou, envolvendo governador, secretários, assessores e quase metade da Câmara Distrital, sem falar na suspeita de que o esquema deitaria raízes em administrações anteriores. Procuro, sem menosprezar os fatos, buscar a causa mais profunda desse escândalo, o que, para mim, está no maior mal praticado contra a Capital da República: a aprovação, pela Constituinte de 1988, de eleições em Brasília. Deixo essa questão, porém, para outro dia.

* O autor é jornalista.

Ary Ribeiro

A partir de hoje, o Jornalista Ary Ribeiro estará contribuindo para o blog do Zé Ricardo com comentários e artigos bem elaborados para reflexão dos leitores. É um ganho e uma honra para o blog tê-lo como colaborador.