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segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Coluna do Ary: O CHOQUE DAS IMAGENS

Ary Ribeiro *

Superfaturamento de obras, propinas, compra de votos, caixa 2, são fatos, infelizmente, corriqueiros na vida pública brasileira. Neste momento mesmo devem estar ocorrendo em vários Estados e também no plano federal. Basta lembrar que o Tribunal de Contas da União encontrou indícios de graves irregularidades em obras a cargo da Petrobrás. Segundo a imprensa, numa só delas, a da Refinaria Abreu Lima, em Pernambuco, o orçamento teria saltado de US$ 4,05 bilhões para US$ 12 bilhões. Agora surge outra notícia, a de que a Polícia Federal apontou superfaturamento de quase R$ 1 bilhão em obras aeroportuárias contratadas no curso do primeiro mandato do presidente Lula, o que não que ele soubesse disso.

Todos estão lembrados do “mensalão”, que guarda muita semelhança com os lamentáveis fatos ocorridos em Brasília. Só não houve imagens das malas de dinheiro que vinham periodicamente de Minas, dos aquinhoados embolsando sua parte e dos dólares escondidos na cueca de um deputado cearense, o que, para a Procuradoria-Geral da República, no entanto, foi considerado irrelevante. Ela encontrou material suficiente para denunciar quase 40 envolvidos, inclusive ex-ministros e políticos que integravam o alto escalão do Planalto e a direção do PT – e o STF instaurou os processos.

Houve, sim, algumas imagens, mas poucas: a daquele alto funcionário do Planalto pedindo propina a um empresário do jogo e outra de dinheiro sendo passado a um funcionário dos Correios – aliás, fato que desencadeou o episódio do “mensalão” – e, depois, daquele montão de dinheiro (até hoje de origem não identificada) descoberto, em São Paulo, com petistas que aparentemente pretendiam usá-lo para adquirir falso dossiê contra José Serra, então candidato ao governo de São Paulo nas últimas eleições.

Então, por que o choque com o escândalo de Brasília, se esses fatos não constituem novidade? Porque aqui tudo foi meticulosamente filmado. Foi o choque das imagens, de se ver por dentro o monstro da corrupção. Todo mundo, no País inteiro, pôde ver a naturalidade, a desfaçatez e até, se pode dizer, a displicência com que alguns recebiam boladas de dinheiro e as colocavam em pastas, bolsas, meias - e até se agradecia a Deus pelo dinheiro fácil ... Foi isso que nos deixou revoltados, além do vulto que a coisa tomou, envolvendo governador, secretários, assessores e quase metade da Câmara Distrital, sem falar na suspeita de que o esquema deitaria raízes em administrações anteriores. Procuro, sem menosprezar os fatos, buscar a causa mais profunda desse escândalo, o que, para mim, está no maior mal praticado contra a Capital da República: a aprovação, pela Constituinte de 1988, de eleições em Brasília. Deixo essa questão, porém, para outro dia.

* O autor é jornalista.

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