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segunda-feira, 5 de abril de 2010

OPÇÕES NA MESA

05/04/2010


Ary Ribeiro *

As cartas estão na mesa. Os dois principais nomes para a disputa presidencial de outubro estão praticamente no páreo, sem mencionar que Dilma Rousseff vinha correndo sozinha (ou melhor, com Lula) há bastante tempo. José Serra esperou, no cargo, até o último momento. Agora estão ambos afastados dos cargos públicos: ela já é formalmente pré-candidata; ele terá sua pré-candidatura formalizada sábado, em reunião que o PSDB realizará em Brasília.

Ciro Gomes ainda é uma incógnita. Não se sabe se será ou não candidato. Marina Silva seria o terceiro ou quarto nome. A seguir, virão aqueles os de pequenas e quase desconhecidas siglas partidárias, quase todos apenas com traços nos índices de pesquisas de intenção de votos.

Atendo-se aos dois nomes principais, as opções também estão na mesa. Dilma oferece a continuação do governo Lula. Mais do mesmo. Não se pode dizer que as pessoas, de modo geral, estejam descontentes com o atual governo, pois as pesquisas estão aí a dar a resposta. Mas é preciso lembrar que a situação relativamente boa vivida pelo País se deve sobretudo aos governos Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso, que criaram o Real, estabilizando o valor do dinheiro, e (o segundo) mecanismos que permitiram sanear a economia. Aécio Neves assinala bem esse fato em entrevista publicada nas páginas amarelas da Veja desta semana: “Somos (o PSDB) a matriz de todos os avanços sociais e econômicos do Brasil contemporâneo.”


O Wall Street Journal, que há poucos dias publicara caderno de 12 páginas (pago?), citando Lula, Dilma, Meirelles, e dizendo que, para o Brasil, “o amanhã finalmente chegou”, hoje (dia 5) traz em sua página de Opinião artigo de Mary Anastasia O’Grady intitulado: Cub Your Enthusiasm for Brazil (numa livre tradução: “Contenha seu entusiasmo pelo Brasil”). Ela assinala: “O presidente Lula da Silva ganha elogios de empresários como Eike Batista, mas uma retrospectiva desde a sua posse mostra que o melhor que ele fez como executivo-chefe do país foi não fazer nada. Quer dizer, ele não desfez as conquistas monetárias e fiscais de (Fernando Henrique) Cardoso.”

A articulista nota ainda que o Brasil ocupa o 129º lugar no ranking “facilidade para fazer negócios”, na classificação do Banco Mundial. Ela não diz, mas há outras coisas que não vão bem. A boa vontade para com o governo, apontada pelas pesquisas de opinião pública, só pode ser explicada pela facilidade ao consumismo, porque quem tem de se utilizar do serviço público de saúde sabe bem em que estado lastimável se encontra. E a educação? E os serviços de modo geral? Há dados concretos indicando problemas. No fim de semana a imprensa divulgou que o mês de março registrou o menor superávit (para o mesmo mês) da balança comercial nos últimos dez anos, e ainda que, em 2009, a participação do Brasil no comércio global foi de apenas 1,2%. O País ocupa a 24ª posição no ranking da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Então, “o Brasil pode mais”. Essa é a opção proposta por Serra e por ele anunciada na despedida do cargo de governador de São Paulo. Como o setor macroeconômico passou mais ou menos intacto pelo governo Lula, o “poder mais”, aí, significaria fazer reformas ainda necessárias, melhorar substancialmente a Saúde pública e a Educação e tornar mais eficientes os serviços oferecidos pelo Estado aos cidadãos. Serra e Aécio procuraram fazer isso como governadores. Na citada entrevista, Aécio disse como tornou eficiente a máquina do serviço público em seu Estado: “Estabelecemos metas para todos os servidores, dos professores aos policiais. E 100% deles passaram a receber remuneração extra sempre que atingissem as metas acordadas. O governo começou a funcionar como se fosse uma empresa. Os resultados apareceram com uma rapidez impressionante. A mortalidade infantil em Minas caiu mais do que em qualquer outro Estado, a desnutrição infantil das regiões mais pobres chegou perto do patamar das regiões mais ricas, todas as cidades do Estado agora são ligadas por asfalto, a energia elétrica foi levada a todas as comunidades rurais e mesmo as mais pobres passaram a ter saneamento. Na segurança pública conseguimos avanços notáveis com a efetiva diminuição de todos os tipos de crime.”

É por isso que, na área tucana, a pressão é grande para que Aécio aceite ser o vice na chapa de Serra. Em artigo publicado no Estadão de domingo, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso faz apelo indireto, mas muito forte, nesse sentido, ao lembrar que a aliança entre Minas e São Paulo “salvou-nos do autoritarismo no passado”. Referia-se ao fato de que, perdida a luta pelas Diretas-já, a Oposição vislumbrara a possibilidade de vitória no Colégio Eleitoral e decidira lançar candidato (a Oposição, lembro, menos o PT, que expulsou os três deputados que ousaram votar em Tancredo Neves). Ulysses Guimarães, que era o principal líder da Oposição, foi com o próprio Fernando Henrique falar com o governador paulista Franco Montoro e chegaram à conclusão de que o nome mais viável para a disputa no Colégio Eleitoral era o do então governador mineiro, Tancredo Neves, avô de Aécio.

“Mais do que os méritos e as ambições de cada um – relata FHC – contava o momento histórico. Ou nos uníamos e ampliávamos a frente contra o autoritarismo ou este permaneceria por mais tempo, esmaecido que fosse, com a eleição de Paulo Maluf, candidato da Arena. A visão de futuro e o interesse nacional contavam mais do que as biografias. Tiveram grandeza. São Paulo se uniu a Minas para que o Brasil avançasse e Ulysses chefiou a campanha pela eleição de Tancredo.” Agora, acrescenta, “é imperioso que as oposições se unam”. (...) “José Serra e Aécio Neves estiveram ao lado dos que permitiram derrotar o regime autoritário. Cabe-lhes agora conduzir-nos para uma vitória que nos dê esperança de dias melhores. Tenho certeza de que não nos decepcionarão.”

E já que falo em Fernando Henrique Cardoso, na semana passada ele aceitou convite do caderno Aliás, do Estadão, para debate com três renomados intelectuais – o sociólogo José de Souza Martins, o filósofo Renato Janine Ribeiro e o cientista político Renato Lessa – no antigo salão nobre da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, local em que ele defendeu, em 1961, sua tese de Doutorado. Ontem, o caderno Aliás publicou em duas páginas resumo que vale a pena ser lido, pelas reflexões feitas sobre a realidade econômica, social e política do País. Vai aqui pequena amostra: “Acho que estamos muito viciados no economicismo do pensamento. Pensamos tudo em termos do que é possível na economia. A gente só se preocupa com cresceu o PIB. Eu vou repetir o que disse há poucos dias a um repórter americano do Miami Herald. Ele me perguntou: O senhor acha que o Brasil vai ser mesmo a quinta potência do mundo? Eu disse: Pode ser, mas o que você chama de potência? Produto Interno Bruto? Então talvez seja. Mas não é essa a pergunta correta. Tem que perguntar: O senhor acha que o Brasil vai ser uma sociedade mais decente, mais digna , mais solidária, mais coesa, melhor para o seu povo, com mais igualdade? Aí eu tenho dúvidas. Do ponto de vista econômico, o Brasil vai continuar crescendo. (...) (Mas) Como é que vamos ter realmente uma sociedade decente? Como vamos fazer para dar uma educação que permita ao Brasil avançar mais? Há muitos anos eu digo que no dia em que o País tiver telefonista ou empregada doméstica capaz de anotar um recado, então terá se desenvolvido.”

Para terminar: Domingo, além da Páscoa, foi um dia de Fernando Henrique, que por sinal está lançando mais um livro, cujo título se inspirou numa frase que ele nega haver pronunciado (esqueçam o que escrevi): “Relembrando o que Escrevi: da Reconquista da Democracia aos Desafios Globais”.

* O autor é jornalista.

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