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terça-feira, 20 de julho de 2010

Coluna do Ary Ribeiro

A ESCOLHA DE DILMA

Ary Ribeiro


Imaginava-se que o candidato natural à sucessão de Lula seria José Dirceu ou Antonio Palocci, as duas grandes figuras do começo e de boa parte do seu governo e do PT. O primeiro, na chefia da Casa Civil, era o comandante da área política e administrativa, uma espécie de Primeiro Ministro. O segundo, o czar das finanças, foi o responsável pela manutenção da política macroecômica herdada do governo Fernando Henrique e por afastar os fundados receios que investidores, banqueiros e grandes empresários tinham diante de um governo petista.

Ambos soçobraram pelo caminho. Primeiro, foi Dirceu, que, enredado no caso do mensalão, deixou o Planalto, teve cassado o mandato de deputado federal e acabou integrando o rol de acusados que respondem a processo no Supremo Tribunal Federal. Depois, foi a vez de Palocci. Acusado de envolvimento no caso da quebra de sigilo bancário do caseiro Francenildo, deixou o cargo de Ministro da Fazenda. (Recentemente, por 5 votos a 4, o STF, arquivou a denúncia por “insuficiência de provas”.)

A exclusão dos dois potenciais candidatos à sucessão, teria vindo a calhar para o não tão recôndito desejo de Lula de continuar no Planalto. Já tinham sido feitas, no Congresso, tentativas para a aprovação de mais uma reeleição. Falava-se num terceiro mandato. Um banco chegou a lançar propaganda na qual muita gente viu mensagem subliminar, pois, não me lembro a propósito do que, o número 3 aparecia com destaque. Lula, porém, parece não ter querido correr o risco de entrar abertamente nessa causa e sofrer derrota no Congresso. A ideia morreu.

Então, com a saída de cena de Dirceu e Palocci, ele se teria visto livre para buscar o terceiro mandato por via indireta. Nenhum dos dois, por terem voo e liderança próprios, se sujeitaria a ser a sombra de um ex-presidente. E seria muito difícil afastar a candidatura de um ou de outro. Dilma Rousseff seria figurino perfeito, pois era uma desconhecida (popular e politicamente), nunca disputara uma eleição e não pertencia a nenhuma das correntes do PT, onde era, por sinal, “cristã-nova”, pois viera do PDT. Lula a escolheu, em detrimento de outras importantes figuras do seu partido, como, por exemplo, Tarso Genro, Aloizio Mercadante, José Eduardo Dutra ou Martha Suplicy. Se eleita, Dilma – que ele impôs ao partido – iria devê-lo exclusivamente à força do seu criador. Ele declarou que “na cédula” seu nome será o dela e participa da campanha com tal desenvoltura que já amealhou seis multas da Justiça Eleitoral.

Aparentemente, Lula imaginaria que, eleita Dilma, ele é que estaria no poder com ela. Continuaria mandando e usufruindo de todas as regalias. Com a óbvia diferença de não se tratar de marido e mulher, ele estaria para ela como Néstor está para Cristina Kirchner, na Argentina. Mas – e aí vem o “mas” – quem garantiria que as coisas se passariam como nesse suposto script? A vida política está repleta de casos de “traição”, de criaturas que se voltaram contra o criador. Nem seria caso de “traição” propriamente dita, mas de querer ter vida própria, de não aceitar ingerências.

Para continuar com estas reflexões, Dilma, se eleita, poderia ser muito grata ao presidente por tê-la escolhido e ter sido seu grande cabo eleitoral, mas poderia não querer tê-lo permanentemente ao seu lado, como se fosse ele o real presidente. E isso seria muito plausível segundo o testemunho de todos que tiveram contato mais próximo com ela. Dizem tratar-se pessoa de temperamento forte, impositivo, de pouco diálogo. Além disso, ideológica e politicamente, ela estaria mais afinada com setores esquerdistas radicais do que com o moderado e conciliador Lula. É certo que ela não iria poder pôr em prática aqueles polêmicos pontos do terceiro Plano Nacional de Direitos Humanos ou os do primeiro programa apresentado ao TSE, com sua rubrica, e depois substituído. Ela estaria contida pelo seu “ao redor”, ou seja, pelos partidos aliados, mas conservadores, e pelas forças sociais e econômicas do País. Nenhum governante faz o que quer, mas o que as circunstâncias permitem. Sempre sobraria, contudo, espaço para dar mais força que Lula a algumas posições radicais, como certo controle da imprensa, da educação e da cultura. E acima de tudo, ela não haveria de querer que seu nome passasse à História – primeira mulher a ocupar o alto e honroso cargo – como presidente-fantoche.



RISCO PARA OS FICHAS SUJAS


Em entrevista ao Correio Braziliense, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Ricardo Lewandowski, deixou claro que correm risco de ter o registro cassado ou, se eleitos, o próprio mandato, aqueles que estão obtendo liminares para disputar as eleições. Ele, que integra também o Supremo Tribunal Federal, disse ter esperança de que essa Corte manterá a interpretação do TSE, segundo a qual a Lei da Ficha Limpa se aplica às eleições deste ano e alcança situações passadas. Para ele, essa lei propicia a moralização dos costumes políticos.



DESSERVIÇO À DEMOCRACIA


Circula pela Internet e-mails remetendo a uma cena gravada na Câmara dos Deputados pelo programa CQC, da Rede Bandeirantes, e reproduzida no YouTube. Nela, aparece uma jovem dirigindo-se a apressados deputados no corredor que liga o Anexo 2 ao Anexo 4 da Câmara e pedindo-lhes a assinatura numa Proposta de Emenda Constitucional. A seguir, outra jovem, microfone na mão, pergunta aos deputados se sabiam o que haviam assinado. Embaraçados, dão atrapalhadas explicações. Então, a jovem revela: trata-se de proposta de fictício deputado para incluir a cachaça na cesta básica.

Quem viu a cena na TV ou a vê no YouTube e não conhece o funcionamento do Congresso fica justamente escandalizado. É preciso esclarecer que uma PEC, para ser apresentada, tem de ter a assinatura de um terço dos integrantes da respectiva Casa legislativa, Câmara ou Senado, e os parlamentares não costumam negar essa colaboração aos colegas. Depois, assinar, nesse caso, não significa estar de acordo com a proposta. É apenas uma ajuda para que possa ser apresentada. Tanto que na linguagem parlamentar isso é chamado de “apoiamento”, para diferenciar do puro e simples apoio.

Pode-se indagar: então assinam mesmo sem ler? Em muitos casos, sim, porque não faz diferença, já que assinar, como se disse, não significa comprometimento. Depois, dificilmente alguém apresentaria proposta tão ridícula como aquela. Pode-se fazer muitos reparos a membros do Congresso, menos o de que sejam burros ou tolos. Ninguém assim conseguiria sair candidato e obter 20 mil ou 300 mil votos, conforme a unidade da Federação. Além disso, qualquer proposta, após a apresentação, é encaminhada às comissões técnicas e ali, sim, sua constitucionalidade, juridicidade e mérito são avaliados e, se não tiver um mínimo de cabimento, não irá adiante.

Então, o que o CQC fez foi uma graça em torno de caso – projeto absurdo – que não ocorre na prática. Pôs em ridículo uma instituição essencial ao regime democrático e que deve ser, sim, seriamente criticada e melhorada, como agora se procura fazer, por exemplo, com a Lei da Ficha Limpa, e nunca desprezada como algo que pode ser descartado.



E O CIRO GOMES, HEM?


O político cearense, que já foi candidato à Presidência da República, pretendia concorrer de novo e com o apoio de Lula. Achava que teria muito mais aceitação que Dilma Rousseff. Conversou com o presidente e este, ao que parece, não descartou a possibilidade. E até convenceu Ciro Gomes a transferir para São Paulo seu domicílio eleitoral, porque poderia ser também uma alternativa de candidato ao governo daquele Estado, com o apoio do PT. Ciro transferiu o título, mas não conseguiu nem uma coisa nem outra. Ficou na mão. Agora, de volta ao Ceará, trabalha pela reeleição do seu irmão Cid Gomes ao governo estadual – e, indiretamente, também pela candidatura Dilma. E, situação ainda mais irônica: não pode nem votar no irmão, porque seu título é de São Paulo.



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