11/10/2010
DILMA, A OUTRA FACE
Ary Ribeiro
Finalmente, ao menos a pequena parcela do eleitorado que permaneceu ligada na TV Band até quase à meia noite de ontem, domingo, pôde ver um pouco da outra face (a verdadeira) da candidata Dilma Rousseff.
Dilma, como a Lua, mantinha uma face oculta, fora das vistas do eleitorado. A candidata que andava por aí era só sorrisos. Uma versão marketeada do “paz e amor” da campanha do seu padrinho político.
Essa face não correspondia a tudo que se dizia do comportamento dela como ministra, que muitas vezes seria um tanto ríspida com auxiliares, jornalistas e até colegas de Ministério, a ponto de vários deles, após despacho com ela, irem se queixar ao presidente da República.
Ontem à noite, no primeiro debate entre os dois candidatos, na televisão, eis que surge uma Dilma diferente, agressiva, do começo ao fim, levando seu adversário, José Serra, a dizer-se “surpreendido”.
Seus marketeiros devem ter concluído que num debate mais tranqüilo, ela correria o risco de ser massacrada pela experiência e pelo preparo de Serra. Seria melhor, portanto, partir para acusações, dizendo-se vítima de calúnias, mentiras, “baixarias”, por parte de seguidores dele e, assim, colocá-lo na defensiva.
Serra resistiu bem, rebatendo as acusações sem se alterar. Insistiu em que só tem uma cara, não muda de opinião ao sabor de conveniências eleitorais. Citou declarações contraditórias da candidata a respeito do aborto e da crença em Deus. Afirmou não ter nada a esconder em sua vida, deixando no ar intrigante interrogação. E disse que a candidata e o PT é que dão margem ao surgimento do que classificam de “baixarias”, culpando adversários e a imprensa por isso. São os casos de violação de sigilos fiscais tucanos, da denúncia de tráfico de influência na gestão de Erenice Guerra – ex-mão direita da própria Dilma – na Chefia da Casa Civil da Presidência da República e, agora, da notícia sobre contratos superfaturados nos Correios.
Dilma até disse que “no próximo bloco” voltaria à questão da Erenice, mas não o fez. Ela, mais uma vez, como Lula fizera com Geraldo Alckmin, em 2006, levantou a questão das privatizações. Sem êxito, porém. Serra, preparado, defendeu-as. Se fosse pelo PT, segundo ele, não haveria esses milhões de telefone celular, o Brasil seria “o país dos orelhões”. Os fundos de pensão, em geral controlados por sindicalistas do PT, são donos de boa parte da Vale. O PT segue o ditado chileno: “predica, mas não pratica”. Nas campanhas eleitorais, fala contra a privatização, mas, no governo, privatiza, como fez com dois bancos estatais no Nordeste. E não desprivatizou nada.
Serra ainda foi mais além, ao dizer que vai, isto sim, “reestatizar” a Petrobras, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica, os Correios e o BNDES, que, segundo ele, foram loteados entre os partidos que apóiam o governo.
Serra ouviu a candidata dizer que, se eleita, vai fazer não sei quantos centros de saúde, não sei quantas escolas, não sei quantas creches, não sei quantas casas, não sei o que para coibir o tráfico de armas e de drogas. Perdeu a oportunidade de perguntar por que não fez isso nos quase oito anos que passou no governo. Todo mundo sabe que a educação, a saúde pública e a segurança pública, por exemplo, estão em situação mais do que calamitosa.
Enfim, esse primeiro debate serviu para os candidatos começarem a aparecer, para o eleitor, como realmente são.
NADA DEFINIDO
A última pesquisa do DataFolha revelou o que já se previa: o segundo turno é mesmo nova eleição e nada está decidido. Dilma está com 48 pontos e Serra com 41. A diferença entre ambos, que no primeiro turno era de 14,30% -- Dilma obteve 46,91% dos votos e Serra, 32,61% -- caiu para 7%.
Na verdade, a diferença pode ser menor, como demonstra José Roberto de Toledo, especialista em pesquisas eleitorais. Serra não precisa de mais 7% dos votos para vencer. Bastaria que 4% dos eleitores, em vez de votar na Dilma, votassem em Serra. Um eleitor que assim proceda produz efeito duplo: tira voto de um candidato e o transfere para outro.
É claro que a migração de votos pode ocorrer em sentido contrário, aumentando a votação da candidata oficial. Tem-se de aguardar a abertura das urnas. Por isso, até lá nada estará decidido. Ninguém poderá ficar cantando vitória antecipadamente, como havia acontecido no primeiro turno.
BRIGA NO ARRAIAL
Enquanto as coisas não se definem, as principais correntes no arraial governista vão desensarilhando as armas. Dentro do PT, são três os que se preparam para dominar o próximo governo: o ex-ministro da Fazenda, Antonio Palocci (graças ao qual foram mantidas as linhas da política macroeconômica do governo Fernando Henrique, responsáveis pelos frutos colhidos pelo governo Lula), o ex-chefe da Casa Civil, José Dirceu (opositor daquela política) e, claro, Lula, que lançou uma candidata sem votos e à revelia do PT justamente para ter de fato um terceiro mandato. O PMDB, por sua vez, não se conforma em estar num segundo plano (abaixo do PT). Quer o lugar privilegiado de “sócio” do possível futuro governo, em igualdade de condições com o PT. E para complicar mais as coisas, o novo membro da coordenadoria da campanha de Dilma, Ciro Gomes, assumiu a função fazendo duríssimas críticas ao PMDB.
**********
quinta-feira, 14 de outubro de 2010
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário