Minha esperança, um governo mais eficiente na gestão da coisa pública, menos populista e menos personalista.
do blog do Noblat
Um porta-voz de si mesmo 01 de janeiro de 2011 | 2h 49
João Bosco Rabello
O presidente Lula entrará para a história como o que mais falou para o País. Compareceu diariamente aos telejornais, para manifestar-se sobre tudo e sobre nada. Não há exagero em dizer que governou literalmente do alto dos palanques. Foi o porta-voz da República e de si mesmo.
Essa circunstância, mais que qualquer outra, dá consistência ao bordão que usou exaustivamente, do "nunca antes neste país". Lula fez nada menos que 2.519 pronunciamentos nos seus oito anos de mandato, o que equivale a um discurso diário.
Não entram nessa conta as declarações avulsas e de improviso nos chamados "quebra-queixo" (as entrevistas não programadas, dadas em pé) nem o programa Café com o Presidente.
Longe da casualidade, a performance é estratégica: permitiu que impusesse, pela insistência, suas versões, a despeito, não poucas vezes, dos fatos. De quebra, deixou a impressão de ter feito muito mais do que fez. E de ter acertado bem mais do que acertou. E era exatamente essa a ideia. Nesses termos, foi bem-sucedido.
O duelo das versões com os fatos começou pela difusão da ideia de "herança maldita", mencionada já no dia seguinte à posse.
Estabelecida, usurpou de seu antecessor a autoria do programa que lhe permitiu êxitos na economia: fim da inflação, Lei de Responsabilidade Fiscal, câmbio flutuante autonomia operacional do Banco Central.
Lula manteve o modelo econômico que herdou (e combateu), inclusive nomeando como autoridade monetária máxima um quadro do PSDB, Henrique Meirelles, cuja performance técnica lhe permitiu ousar nos programas sociais, obtendo tal popularidade que o blindou dos constantes desvios éticos de seu governo.
O mérito de preservar (sem confessar) o modelo, associado à ampliação da política assistencialista (também inspirada no antecessor), produziu efetivamente transferência de renda. A ousadia na administração da crise externa incluiu de vez as classes C e D no mercado consumidor, com a expansão do crédito.
Transferência de renda, expansão do crédito e do consumo deram-lhe a vitória eleitoral - e um lugar mitológico na história política nacional -, mas configuram uma camada bruta de maquiagem na falta de gestão que permeou seu governo e no retrocesso político que significou o exercício de uma democracia direta viabilizada por um Legislativo acocorado.
A sucessora que elegeu assume o comando pressionada por um ajuste fiscal sempre sofismado e herda os efeitos da ausência de gestão de seu padrinho político: um País sem infraestrutura para o crescimento que se anuncia; um ensino sem qualidade, administrado por estatísticas; saúde e segurança em estado falimentar.
Além disso, Dilma Rousseff terá de administrar uma aliança fisiológica tão heterogênea que Lula não a quis para si próprio.
No plano político, à falta de qualquer sinal mínimo de reforma, a memória que fica é a do presidente que violou todas as regras e princípios que regem a conduta de um chefe de nação, sobretudo no período eleitoral, que antecipou ilegalmente em quase dois anos. Permitiu-se até o deboche, sem que a Justiça Eleitoral reagisse.
Na política externa, saiu pior do que entrou. Chegou ao destempero de comemorar a crise econômica dos Estados Unidos - de resto, mola propulsora do declínio da Europa e responsável pela crise internacional, que infelicita milhões de pessoas. Passou um sentimento juvenil de vingança contra o "imperialismo do Tio Sam".
O seu legado é positivo pelo que exibiu de sensibilidade social, mas amplamente negativo pela conduta populista extremada, que costuma apresentar a conta de seus efeitos bem depois. Sua despedida do poder - a mais ruidosa de que se tem notícia - impõe ao País uma overdose de personalismo.
Tudo sugere - essa a esperança dos cientistas políticos que ele tanto ironiza - que sua sucessora se defina por um perfil mais gestor que político, até porque o primeiro ela o tem; o segundo terá de aprender na prática.
A expectativa, em suma, é de que haverá sensível redução personalista da instituição Presidência da República em favor de uma gestão voltada para reformas inadiáveis, como as da Previdência, do trabalho e política, com mais eficiência e menos marketing. Isso, claro, se Lula, que não dá sinais de que sairá de cena, o permitir.
http://oglobo.globo.com/pais/noblat/Default.asp?a=111&cod_blog=129&ch=n&palavra=&pagAtual=3
quarta-feira, 5 de janeiro de 2011
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