02/08/2010
DILMA E SEU ESTILO
Ary Ribeiro
Em sua edição de ontem, domingo, o jornal O Estado de S.Paulo dedicou duas páginas a uma entrevista concedida pela candidata Dilma Rousseff aos jornalistas João Bosco Rabello, João Domingos e Ricardo Grinbaum.
Está dividida em duas partes: uma política, outra econômica. Nesta última, a candidata sente-se em “sua praia”, esbalda-se com números e informações com os quais cansou de lidar enquanto ocupou o Ministério das Minas e Energia e a Chefia da Casa Civil.
Na parte política, no entanto, ela não consegue disfarçar o incômodo que lhe causam quase todas as perguntas e reage quase sempre com certa agressividade – estilo que dizem que ele sempre usava no trato com auxiliares, jornalistas e até mesmo ministros de Estado.
Para reflexão, vão aqui algumas perguntas e parte das respostas:
Sobre o caráter intervencionista do primeiro programa da candidata, registrado no TSE e depois, diante das reações adversas, substituído, Dilma diz que a repercussão lembra o episódio do medo na primeira eleição de Lula.
Jornalista – Naquela ocasião, a menção ao medo foi mais vaga. Agora se trata de um programa de governo...
Dilma – Vaga? Você me desculpe, mas hoje continua sendo um discurso (...)
J – Mas no primeiro programa está escrito: o controle social da mídia...
D – Não está! Não está com essas palavras. (...)
J – Em vez de controle social, está escrito controle público dos meios de comunicação. Qual a diferença?
D – Você já viu controle social do setor petróleo? Controle social do setor de energia elétrica? Não existe isso. (Qual seria a relação entre uma coisa e outra?) O controle social sobre a mídia é... como se chama aquilo? Controle remoto. O melhor controle é o controle remoto. Quando nós tivemos – e ainda temos – o poder de fazer, jamais fizemos isso.
(Os jornalistas deixam de pedir que ela esclareça o que vem a ser exatamente “controle remoto”, mas pela sequência dá para entender que se trata de pressão.)
J – Quando é que vocês tiveram o poder de fazer?
D – Uai (a expressão, aconselhada por marqueteiros, é para lembrar sua origem mineira), dentro do exercício do governo. Jamais, em momento algum, fizemos qualquer tentativa de censurar, coibir, jamais, em tempo algum, reclamar de jornalista.
(Pela Internet se atribuiu ao governo o fato de o apresentador Boris Casoy ter andado bom tempo fora da televisão e sua associada, Salete Lemos, não mais ter voltado, mas nenhum dos dois disse nada e não se pode concluir que tenham sido atingidos por algum “controle remoto”.)
J – Mas a queixa é válida, a censura ou o controle é que não...
D – Não, querido. (...) Tem uma clara tentativa de coibir o jornalista. A mim me espanta que você ache válida.
J – E em relação à questão agrária...
D – (...) Temos clareza absoluta. Nós não somos o MST.
J – Mas tem as invasões...
D – Reduziu. E não condeno de hoje não. Condeno desde o início do governo Lula. Ele condenou também explicitamente. (...)
(Ela e o presidente podem ter condenado as invasões, mas o governo tratou de dificultar a retirada de invasores. Em 11 de abril de 2008, o Ministério do Desenvolvimento Agrário editou um “Manual de Diretrizes Nacionais para a Execução de Mandados Judiciais de Manutenção e Reintegração de Posse Coletiva”. Ou seja, estabeleceu como essas decisões judiciais devem ser cumpridas. A autoridade policial, em atenção aos direitos humanos, tem de fazê-lo articulada com quase uma dezena de entidades. E as invasões são denominadas de ocupações.)
J – O João Stédile está anunciando que no seu eventual governo vão aumentar as invasões.
D – Bem, talvez o Stédile tenha assim uma certa coisa contra mim. Mas não vai ser mole.
J – Ele não se sente estimulado porque o governo está sendo tolerante com as invasões?
D – Ah, é? E por que reduziu, hem? (...)
J – Talvez o momento eleitoral...
D – Negativo. Reduziu porque fizemos uma política que tirou as principais bandeiras deles.
(Sobre presos políticos em Cuba, Dilma diz ser radicalmente contra qualquer prisão política. Uma resposta genérica. Para Fidel, não há presos políticos em Cuba e sim criminosos comuns.)
J – O caso do dossiê (que seria usado contra Serra), ficou agravado pela quebra de sigilo ocorrida na Receita Federal...
D – O que não vou aceitar, em hipótese alguma, é que queiram colocar no colo da minha campanha papeis que não foram produzidos no nosso ambiente. Nós não vamos aceitar isso (bate na mesa)! E mais: não vamos concordar com acusações de quem não pode provar ou de quem acusa e não mostra.
J – Mas essa quebra do sigilo não mostra que há um certo empenho pela produção desse tipo de conteúdo?
D – Quero saber onde está que alguém da minha campanha quebrou o sigilo. Qual é o princípio fundamental da democracia? Quem acusa que prove.
ÍNDIO NÃO QUER APITO
Ao contrário do proclamado na famosa marchinha de carnaval de Haroldo Lobo e Milton de Oliveira: “Ê ê ê ê ê índio quer apito/ Se não der pau vai comer”), os índios brasileiros, como desde a chegada dos colonizadores europeus, não querem saber de apito e sim de integrar-se à civilização. No passado, os objetos de desejo eram armas de fogo, espadas, facas, serras, espelhos, roupas e outras quinquilharias. Hoje, são trator, televisão, telefone celular, Internet, escola e saúde.
Isto vem a propósito de recente resposta que o comandante de um Batalhão do Exército, na Amazônia, deu ao ser indagado sobre os problemas indígenas locais. "Isso é coisa de São Paulo e Brasília. Aqui índio quer é ver TV no quartel e ser cuidado pelo meu serviço médico..."
Em vez de ir ao encontro da aspiração indígena, o governo (e não apenas o atual) tem feito o que algumas ONG e antropologistas pedem: que sejam reservadas a povos indígenas imensas áreas do território nacional (muitas das quais nas fronteiras), a fim de que fiquem preservados ali como amostras vivas de remoto passado. Para não dizer que talvez isso dissimule também escusos interesses estrangeiros, porque esses territórios ficam como que apartados da soberania nacional. São como nações dentro da Nação.
Para que as desmesuradas extensões das reservas, se os índios nelas localizados não mais vivem da caça e da pesca, não são povos nômades, que mudam de um lugar para outro quando a alimentação escasseia? Esses índios, hoje, cortam e vendem madeira (até ilegalmente), cultivam a terra e anseiam pelos bens da civilização.
Está aí uma política que deveria ser revista pelo próximo governo. Os índios, com certeza, aplaudiriam.
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segunda-feira, 2 de agosto de 2010
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