Eu participei da equipe que introduziu o sistema de metas para a inflação no Brasil.
Naquele momento pensou-se em se introduzir um núcleo de inflação, descartando do IPCA os itens mais voláteis como alimentação e combustíveis. Alguns países que também adotavam o sistema de metas para a inflação como política monetária faziam isto. O entendimento final da equipe é que o núcleo tornaria pouco acreditável o sistema, pois introduziria um complicador para o cidadão entender o que o Banco Central estava fazendo.
Quase onze anos depois, uma boa parte dos países que adotavam um núcleo de inflação deixou de fazê-lo. Além de pouco transparente, a adoção de um índice expurgado mostrou-se pouco eficiente na tarefa de perseguir a meta de inflação.
Na contramão da experiência internacional, o ministro da Fazenda do Brasil quer agora adotar um índice expurgado. Abaixo apresento entrevista publicada na Folha de São Paulo do pai do sistema de metas no Brasil, o então presidente do Banco Central Armínio Fraga.
ENTREVISTA publicada na Folha de São Paulo em 29/11/2010
ARMÍNIO FRAGA ECONOMISTA
Tirar alimento e combustível da inflação seria erro social
AS PESSOAS "COMEM E ANDAM DE ÔNIBUS", DIZ EX-PRESIDENTE DO BC, SOBRE PROPOSTA DE MANTEGA DE CRIAR ÍNDICE COM EXCLUSÃO DE ITENS
VERENA FORNETTI
TONI SCIARRETTA
DE SÃO PAULO
Armínio Fraga, 53, presidente do Banco Central entre 1999 e 2002, é contra mexer no índice de preços que serve para balizar as metas de inflação, conforme proposta do ministro da Fazenda, Guido Mantega.
O governo cogita criar um índice que exclua a variação de preços de alimentos e dos combustíveis, itens que costumam puxar a inflação para cima, muitas vezes sob influência de fatores climáticos e externos.
Eventualmente, esse índice poderia ser usado para balizar as metas de inflação e facilitar a redução dos juros.
Para Armínio, a meta deve corresponder ao que importa para a sociedade. "O povo come e anda de ônibus."
Na gestão de Armínio, o BC instituiu o regime de metas de inflação. Na época, trabalhou com Alexandre Tombini, futuro presidente do BC. Armínio classifica o colega como crítico e firme, mas construtivo e "de fino trato".
Para ele, será "um luxo" tê-lo à frente do Banco Central.
Folha - Qual é a avaliação do sr. sobre a proposta de expurgo da variação dos produtos alimentícios e dos combustíveis da inflação? Acha que funcionaria aqui, dado nosso passado inflacionário?
Armínio Fraga - Acho um erro, inclusive social e político, excluir qualquer coisa do índice. A meta de inflação tem que corresponder ao que importa para a sociedade; só assim o valor do salário fica protegido. E o povo come e anda de ônibus. Já passei pelo BC, e pensei muito nisso.
O BC leva em conta choques de oferta e choques temporários na condução da política monetária, o que resolve bem a questão levantada pelo ministro Mantega.
Chegou o momento de alterar a meta de inflação?
O próprio governo sinalizou que, em algum momento, seria interessante reduzir a meta. Seria positivo. O país está com meta de 4,5% [IPCA] e inflação um pouco acima. Não se pode considerar que a situação é definitiva.
Ela funcionou muito bem ao longo desse tempo, mas em algum momento seria bom caminhar em direção dos nossos pares. Daqui a dois anos, que se determine que vá para 4%.
Não recomendo nada muito radical, mas, à medida que seja possível, aos poucos, chegar a uma inflação mais baixa, talvez seguindo o caminho do Chile, em torno de 3%, [a redução da meta] ajudaria a diminuir a incerteza, os juros nominal e real.
Seria um passo positivo, mas não está na hora porque a revisão é no meio do ano.
Quem quiser ler o resto da entrevista com Armínio, por favor click no link abaixo.
http://www.meujornal.com.br/ocb/jornal/Materias/Integra.aspx?id=1016375
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